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“Anônimo”, teu nome é mulher

Atualizado: 11 de nov de 2022

Virginia Woolf tem uma frase famosa: “Pela maior parte da história, ‘anônimo’ foi uma mulher.” Ela se referia às escritoras no começo do século XX, obrigadas a se esconder atrás de pseudônimos para difundir suas obras. Temos muitos outros exemplos na história, inclusive mulheres com seus direitos de autor usurpados, como a pintora Margaret Keane, retratada no filme “Grandes Olhos”. Que bom que isso mudou… Mas pera aí, mudou mesmo?

Evoluiu, sem dúvidas. Mas quantas de nós ainda temos a voz calada, ainda temos nosso trabalho preterido, ainda temos que matar o popular ”leão por dia” para termos um mínimo de atenção? E agora, depois dos 50 anos, tenho sentido na pele a força do machismo estrutural.

“A gente precisa se justificar o tempo todo pela idade que temos na certidão.”

Se o preconceito contra a idade (etarismo, idadismo, já tem até nome próprio isso) atinge os homens, que dirá o bombardeio que nós mulheres sofremos por envelhecer! Recentemente, vimos as manifestações de maravilhosas atrizes de Hollywood contra o preconceito estético e profissional de que elas são vítimas. Imagina nós, mulheres comuns…

Uma vez, fiz um comentário sobre política em um post de um famoso. Aí um hater resolve me atacar. Como última tentativa de me ofender, ele escreve: “Você devia estar jogando bingo e fazendo crochê com suas amigas.” Ah, mas eu dei muita risada! Rapaz, minha filha gosta de jogar bingo e faz crochê. Enquanto isso, estou no samba, na pista, vou pro carnaval de biquíni, e tomo minhas cachaças, seu preconceituoso machistinha!

E em app de paquera? Entrei pela primeira vez na pandemia, pra conhecer gente diferente, através do bom e velho bate papo. Tolinha. Um dos primeiros com quem falei era um coroa de sorriso aberto, parecia simpático. Ele propôs conversarmos no zap e eu, inexperiente, aceitei. Ele veio à queima-roupa já me pedir foto do corpo! Não perguntou meu signo, se gosto de maçã ou banana, nada. Foto de corpo. Quando eu disse que não mandaria, ele replicou perguntando o que eu tinha a esconder. Expliquei pacientemente que só queria conhecer outras pessoas, conversar. Ele me desejou boa sorte.

Outro disse na primeira mensagem que poderíamos pular as “perguntas chatas”, e ir logo pro instagram ou zap. Expliquei com menos paciência que “perguntas chatas” evitam situações chatas. Ele então perguntou o que eu queria saber. Com os olhos revirando e muito cansaço, falei que não queria fazer inquérito e pra ele me dizer o que quisesse sobre ele. Aí o sujeito me escreveu um textão, dizendo entre outras coisas que eu era evasiva, cobradora, egocêntrica (não esqueçam que era a 3ª mensagem que ele me mandava…) e no final falou o que? Adivinha? “Boa sorte!”

Imagino que com esse “boa sorte” os alecrins dourados devem querer dizer: “vai ser difícil achar um homem como eu”. Livramento, isso sim!

Sorte mesmo eu tive em conhecer uma mulher que foi minha colega de trabalho lá pelo começo dos anos 2000. Ela tinha uns 60 anos, quadris largos, loira dos cabelos compridos, rosto lindo com suas marcas de idade. Treinávamos corrida depois do trabalho, então saímos juntas da firma com roupa de malhação. Pensa que alguém olhava pra mim? Os seguranças do prédio, povo no caminho, colegas de corrida, todos babando por ela.

Eu sentia uma enorme admiração! Mas a mulherada na empresa não perdoava, ainda mais porque ela namorava um rapaz de 20 anos. “Ela não se dá ao respeito”… Como é que é, minha gente?!

Era o que ela dizia: “sei que ele está comigo porque eu pago a conta, compro roupa, mas e daí? Tenho dinheiro pra gastar como eu quiser.” Já ouvimos essa história antes, sugar daddy que chama, né? O homem pode. Ela contava da vez que estava numa loja comprando roupa pra ele, e a vendedora veio mostrar alguma peça, dizendo que ia ficar muito bem no filho dela. Na lata, minha amiga falou que o filho dela era muito mais velho, aquele era o namorado. Queria tanto ter visto a cara da vendedora…

A gente precisa se justificar o tempo todo pela idade que temos na certidão.

Somos julgadas se fazemos procedimentos estéticos – quer parecer mais jovem -, ou se não fazemos – desleixada. Se pintamos ou não os cabelos brancos. Se namoramos pessoas mais jovens ou se estamos sem relacionamento afetivo.

Eu gosto bastante do conceito ageless, que na tradução literal significa “sem idade”. Somos pessoas que buscam não ser definidas pela faixa etária, mas sim pelo desejo de se sentir bem e plenas em qualquer época da vida. Mas, para isso, a gente tem sim que encarar os preconceitos e tabus, e lutar contra eles com toda a força e a potência que os anos nos dão.

Ana Lúcia Leitão para a coluna 50+

Encontre-a no Instagram @aninhaleitao2

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