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Etnia e Ética

Atualizado: 17 de dez de 2022

Com quem está a razão? Se é que alguém a quer.

Iniciei um processo ao qual tentei fazer com que o meu espírito passasse do composto ao simples tentando manter o equilíbrio entre a razão e a emoção. Aqui cabe confessar que sou sempre, e desde sempre emoção. Por tanto, outra confidencia secreta de minha intimidade. E vale lembra que ser em dias atuais sincera, com filtro e politicamente correta não é tarefa das mais fáceis, exige de mim um esforço redobrado. Um exame minucioso, detalhado de cada elemento que compõe meu corpo e mente com o objetivo de investigar em minha natureza funções e proporções de como dividir a emoção da razão. Confesso total fracasso.  Etnia e ética. Como ser de uma etnia “W” e ter ética para criticar esta mesma etnia “W”? Tem então início uma guerra íntima. Tudo briga contra tudo. O que era liberdade tentava preservar a sua, sem qualquer liberdade.

A minha polícia interna não consegue fazer as leis serem preservadas e cumpridas deixando os indivíduos agirem de forma livre e desordenada. O caos é instalado, e todo e qualquer direito deixa de ser priorizado. Este é o sentimento que me cerca: Caos instalado. Não havendo a possibilidade de agir com liberdade e sensatez, com ética e sendo da etnia “W”, coloca-se nas mãos de “todos” o poder de preservar a sua própria liberdade.

Enfim, vamos ao que interessa. O que sinto de verdade quando alguém me trata no MASCULINO?

Raiva e desprezo. Dependendo de meu estado de espírito e humor, respondo até com certo bom humor: “Olha bem para mim…” Digo em tom moderado e dou uma volta em torno de mim mesma. Continuo: “Se o senhor ou senhora…” Independente da idade do cidadão ou da cidadã trato de senhor e senhora, para tentar manter uma distância segura.

Continuando… “Se o senhor está vendo em sua frente uma imagem masculina, temos um problema grave e sério digno de um impasse. Eu por acreditar que estou no caminho certo de ser feminina. E senhor, de acreditar que não.  Por que eu acredito que sou feminina”.

Faço um esforço absurdo, monstruoso, gigantesco para isso há algum tempo o de ser feminina e o de ter bom humor. Preciso ressaltar que nada contrário a minha natureza. Tomo inibidores sexuais. Ou seja, não tenho qualquer vontade sexual. Amor, carinho, carícia é outro departamento. Os meus níveis de testosterona estão indetectáveis há anos. E assim continuarão e permanecerão por todo sempre amém. Muitos hormônios ingeridos em quantidade grande deles. Tudo administrado por um profissional chamado de médico, com especialização em “Neurologia”. Isto há anos. Em um local destinado apenas para este tratamento. O preço a pagar-se é caro, muito caro, eu que o diga. Depois de algum tempo na “Terapia Hormonal”. Os  hormônios travam o fígado, podendo levar a usuária deste medicamento a comprometer o seu funcionamento. A fragilidade dos ossos. Trombose. Pode surgir gânglios nas axilas, virilhas e seios, por tanto sou obrigada a realizar exames clínicos como desendometria óssea, ultrassonografia mamaria, abdominal e etc… No meu caso, me recusei a implantar qualquer prótese ou realizar qualquer procedimento cirúrgico que mudasse muito a minha aparência. Opção minha e com uma boa força da natureza e do divino espírito santo. Ou seja, lá no que você acredite. E na profissão claro, de professora de ginástica e dança e muita aula de balé. Meus seios são naturais… SIM, senhoras e senhores são naturais e lindos. Enche-me de orgulho todas as vezes que vou à praia e exponho o par de presentes da natureza ao sol. Sim senhoras e senhoras eu sou adepta do “Top Less”. Vale ressaltar que não faço isso em qualquer praia.

Para tal tratamento hormonal, somente acontece depois de uma infinidade de entrevistas, laudos e parecer técnicos onde diz em todas as letras que a SENHORA em questão, está apta a iniciar o tratamento. Sinceramente?  Um Horror! O seu humor muda. Um calor que começa a te enlouquecer e até envergonhar.

Amores, você transpira até por onde nunca imaginou. Sem comentar no mau humor, falta de educação e tato dos “profissionais” destes locais onde o tratamento é feito, inclusive das médicas.  Os profissionais, raros são os que se dignificam a serem educados e corteses. No meu caso sempre foram médicas do sexo feminino quem me atendiam, as neurologistas.

Assunto para outra matéria.

Sem comentar no direito de sermos aquilo que desejarmos. Onde está o direito de ser o que quiser? Desde que não prejudique ao próximo, este direito é meu sim, o de ser eu mesma, e de exigir respeito. Mesmo que às vezes necessite ser incisiva… Se é que vocês me entendem. Tenho caráter forte, costumo agir, geralmente com firmeza, sou firme, olho nos olhos. Sou igual a perfume marcante. Chega chegando. Aquele que provoca a sensação forte e penetrante vou direto ao ponto. Incisiva e ponto.

Não lembro quem disse: “No estado de natureza, não havendo polícia ou leis para impedir que os indivíduos se molestem, põe-se nas mãos de todos o poder de preservar a sua propriedade contra os danos do outro”. “JOHN LOCKE”. Lembrei. Não, verdade tem e deve ser dita: Na realidade fui pesquisar.

Tenho capacidade de garantir que em frações de segundos o meu espírito vai do composto ao simples. Quando tal falto acontece. Na maioria das vezes fica evidente e claro que é pura e tão somente com a intenção de, e para humilhar.  As pessoas se dão ao trabalho idiota de preocupar-se com o “SE” alheio. São capazes de investigar a sua natureza, as suas causas, as suas funções, as crenças, as suas proporções… Com o único intuito, ou melhor, com o objetivo puro e simples de humilhar.

Imaginem vocês em quantas vezes euzinha fui parada naquela chamada de “Escolha Aleatória” que geralmente acontece nos aeroportos de nosso Brasil varonil? Na ultima, Aeroporto Internacional do Galeão, Rio de Janeiro. Detalhes: feriado de nossa senhora do Brasil. Eu estava voltando para São Paulo, no meio do feriado. Nove horas da noite.

Aeroporto completamente vazio. E dai sou escolhida “aleatoriamente” para uma revista completa. Centenas de vezes? Aleatória os cambal. Você é obrigada a tirar tudo… Tudo mesmo! Máscara, óculos, cílios, cinto, abrem todas as suas bagagens de mãos e reviram tudo…bolso, tamanco. É o diferente que causa isso nas pessoas. Basta o cidadão ou a cidadã ter distintivo usar uniforme e em alguns casos sobre nome, basta. Na cabeça dele ou dela basta para se dar ao trabalho de lhe interpor, aqui no caso o de me interpor. Tais fatos e questões de cunho do mal resolvido. Para ela ou ele. Centenas de vezes. Não se dê ao trabalho de reclamar, pedir intervenção, criar conflito ou tentar achar alguém para mediar aquele conflito. Ninguém se envolve. O diferente causa isto nas pessoas. Quando este, digamos “SE” acontece da parte de alguém de origem semelhante a minha a dor é maior. O corte é mais profundo. Costumo batizar o cidadão ou a cidadã de “PES” – Pobre Escroto.

Não pensem vocês que os pares se respeitam. Não! As humilhações veem a galopes ferozes quando do lado de lá esta um gay, uma lésbica ou uma trans ou travesti, uma gorda, uma preta, e na maioria são pobres, no mínimo de espírito. Não é entristecedor?

Os chamados “Direitos Naturais” sabe aqueles?… Liberdade, vida, igualdade, ir e vir e propriedade privada, esta áltima nem mesmo o governo consegue nos proporcionar e muito menos preservar. Qual, ou melhor, onde está a dificuldade de tratar o outro como ele ou ela querem ser tratados? No meu caso em particular, exijo.

Por tanto quando tento refletir sobre a essência dos princípios, valores e problemas fundamentais da moral, acabo me perdendo nestes valores e vem aquele sentimento do início do texto, o de revolta, caos. A impressão é que não existe mais ética. Nem entre as etnias. Ética, ah essa foi esquecida por estes “PES”. Tenho um querido e muito amado primo, professor universitário que ameniza: “Oh minha prima, que pena… Mas no ramo da Filosofia este é o objetivo… refletir sobre valores e problemas fundamentais da moral…” Sim meu muito querido vá você ser importunado todas as vezes que entrar no aeroporto, shopping, supermercado… Mandaria todos pra aquele lugar. O Locke afirmou com todas as letras que somos uma folha em branco ao nascer. E esta vai sendo preenchida na medida em que experimentamos a realidade… Lamento informar e novamente confidenciar: que a minha realidade seja muito deferente da maioria.

Respeito – esta é a palavra de ordem. Quando aprendermos a respeitar todos como todos, começaremos a trilhar a “estrada justa” como o italiano. A ética é a casa do homem, já diziam os filósofos gregos. O ideal é fazermos uma miscelânea com ética e etnia e aguardamos o que surgirá. Misturar tudo e o resultado desta ação, combinação mesclará e ilustrará o meu e o seu cotidiano.

Jogê Pinheiro para a coluna Espartilho Trans

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