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Todas nós conhecemos o gaslighting

Por Giovana Carvalho

Foi numa aula de sociologia que ouvi pela primeira vez o termo “gaslighting”. Atualmente, é uma palavra muito bem conhecida entre mulheres que se aprofundaram no feminismo e que, com certeza, já passaram por uma situação dessas. A palavra tem origem no filme “À Meia-Luz”, por ter em seu enredo uma situação de manipulação psicológica muito clara entre um homem (o abusador) e uma mulher (a vítima). A popularização do vocábulo se dá majoritariamente pelo reconhecimento de micro agressões psicológicas que mulheres vem sofrido e como elas podem passar despercebidas no dia a dia.

Tenho certeza que qualquer mulher já foi chamada de “louca”, “doida” ou algo do gênero, quando esse vocabulário quase sempre é utilizado por homens. Uma das maiores cantoras da atualidade, Taylor Swift, em entrevista com o CBS Sunday Morning, apontou essa diferença de vocabulário entre gêneros em seu meio profissional. De acordo com ela, quando um homem faz algum movimento “estratégico” e uma mulher faz algo igual, é um movimento “calculado”. E assim segue a lista de extensos adjetivos utilizados para tratar as mulheres como excessivamente emocionais e fora de controle, em qualquer situação, mesmo que, em grande parte do tempo, elas apresentem mais estabilidade que os homens.

É extremamente cansativo ter que viver diariamente tendo sua palavra questionada e descreditada quando a de um homem é aceita no mesmo segundo sem hesitação. É profundamente exaustivo ter que segurar nossas emoções, as principais características que nos tornam humanos, para conseguir sermos levadas a sério.

Ter que ficar se repetindo, se provando e se mostrando estável a cada segundo, são tarefas que homens não tem em seu cotidiano, mas mesmo assim alegam que muitas vezes, nós mulheres estamos inventando essa necessidade.

Todas essas atitudes que enfrentamos no dia a dia nos levam a um esgotamento emocional absurdo. Já me encontrei diversas vezes, no final do dia, simplesmente chorando e me sentindo derrotada por não ter a minha palavra acreditada, mesmo tendo apenas dezoito anos de vida. Perdida, por terem pessoas se virando contra mim por conta de distorções inventadas por homens. E o pior acontece com mulheres que tem diagnósticos psiquiátricos e falam abertamente sobre o assunto. Não sentindo necessidade de esconder sua realidade. Conheço diversas que foram consideradas incapazes mentalmente por simplesmente terem depressão, uma doença tão comum.

“É profundamente exaustivo ter que segurar nossas emoções, as principais características que nos tornam humanos, para conseguir sermos levadas a sério.”

É frustrante ver que, mesmo com décadas de luta feminista, ainda vivemos numa sociedade na qual jovens mulheres ainda precisam aprender sobre o que é gaslighting e como lidar com ele na pele. A sensação que tenho é que, não importa o quanto andamos para frente, sempre damos alguns passos para trás. O sentimento de ver a sociedade regredindo e se sentir impotente é no mínimo, decepcionante, principalmente quando você sente parte dessa regressão na pele. Em especial, esse sentimento é devastador, vindo da Geração Z, que nem eu, que busca tanto a equidade na sociedade e luta diariamente contra os preconceitos e injustiças.

Preciso ressaltar que inúmeros passos importantes já foram dados e conquistas atingidas em prol das mulheres. Mesmo com essa sensação de retrocesso, não posso negar que vivemos num mundo muito melhor do que há duas décadas atrás no quesito de conscientização sobre o machismo e a misoginia da sociedade. Se tivesse nascido alguns anos antes, talvez nem tivesse contato com o termo “gaslighting” dentro da minha escola, muito menos como matéria de uma aula de sociologia.

Aprendi durante minhas sessões de terapia que a conscientização é o primeiro passo para mudar algum problema. Reconhecer que existe uma questão e caminhar para que ela seja solucionada pode ser até o início, mas já é alguma coisa. Isto quer dizer que, pelo menos, vivemos numa sociedade que reconhece que há uma injustiça ocorrendo e que está buscando criar, futuramente, um ambiente mais igualitário para nós mulheres.

Não podemos nos acomodar com o silenciamento nunca. Ainda terão muitos homens pela frente que tentarão descreditar e tomar posse de pensamentos geniais apenas por eles terem vindos de mulheres. Esses movimentos são, em sua maioria, extremamente sutis e podem passar despercebidos, ou até serem aceitos, por algumas mulheres. O exercício de questionar a rejeição e as críticas vindas de homens, mesmo aqueles que se denominam “desconstruídos” ou “feministas” (são os mais perigosos!), é imprescindível.

“As melhores pessoas para entenderem e validarem seus sentimentos e sua dor em relação a essas injustiças são outras mulheres, porque elas com certeza já viveram o mesmo que você na pele. “

E, por último, assim seguimos, uma abrindo caminho para outra, uma dando espaço para outra. As melhores pessoas para entenderem e validarem seus sentimentos e sua dor em relação a essas injustiças são outras mulheres, porque elas com certeza já viveram o mesmo que você na pele.

Que possamos seguir desta forma até uma geração que nunca nem precise saber o significado da palavra “gaslighting”. Que possamos seguir até que esse termo não faça parte de nenhum dia a dia e que seja completamente irrelevante para sua vida.

Matéria de Giovana Carvalho para a coluna Empoderamento Feminino

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