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“Está tudo bem”, será?

Atualizado: 15 de jan de 2023

Tema delicado, então vamos sentar e respirar.

Bom, eu quero começar dizendo que nunca passei por isso, mas testemunhei diversos episódios e em todos eu precisei pensar e repensar quando ouvia o “está tudo bem”.

Vamos falar sobre perder um filho ainda na gestação. Se esse tema é delicado para você, pule e leia uma matéria mais divertida. Desmistificar não é disparar gatilhos.

Conversamos aqui de mãe para mãe e eu falei de tantas coisas depois da decisão de ser mãe que seria até injusto não incluir aquelas que quiseram muito e no meio do caminho algo aconteceu. Não ter o filho nos braços é tão ou mais difícil do que ter e acompanhar a sua respiração todos os dias para o resto dos seus dias. Então amores, desromantizem o “está tudo bem” porque não está.

Os médicos dizem que aborto espontâneo na primeira gestação é normal. Eu entendo os termos que eles precisam utilizar e não estou esqui para questionar sistemas ou estatísticas, estou aqui para falar de sentimentos, por isso não gosto desse termo “normal” e até falaremos sobre isso em outro momento.

“As dores seguem para um lugar guardado em nós, às vezes ela vem e as vezes ela vai. Não está tudo bem porque não somos seres preparados para morte, mas você ficará bem da sua forma, no seu tempo.”

Nunca deveria ser normal para uma mulher que escolheu gerar, perder o seu bebê. Nunca, em nenhum momento. Por isso esse conforto que tentam nos passar com o “está tudo bem” não passa disso, uma tentativa de nos confortar. Não está tudo bem porque você gerou uma criança e não importa por quanto tempo, o vínculo existiu e continuará existindo porque você pode até ter outros dez filhos, você envelhecerá lembrando daquele que não nasceu, vai continuar fazendo as contas, falando sobre quantos anos ele faria.

Meu objetivo é te fazer chorar ao relembrar essa perda? Não. Meu objetivo é te dizer que você não passa por isso sozinha e te fazer perceber que muitas outras mães passaram por isso e também precisam falar, sentir, serem ouvida sem aquela ideia de que “está tudo bem”. Falar sobre isso não pode ser um erro. Você precisa falar e em especial, ser respeitada por esta necessidade.

Eu estou te dizendo para lutar pelo seu direito de ficar triste? Se isso lhe faz bem, fique. Tenha o seu luto, talvez suas datas certas para viver esse luto, mas pense que não é correto se silenciar porque a pessoas querem que esteja tudo bem. Porque as pessoas acham que falar é desenterrar a dor, e porque as pessoas preferem esquecer quando tudo o que você quer fazer é lembrar aquele filho que durou tão pouco tempo.

Isso é ruim? Não. Eu, Tatiana, não sou o tipo de pessoa que leva a vida lamentando a morte, porém, lembrem-se do que falei no início deste artigo, eu nunca perdi um filho, nem durante a gestação nem depois disso, mas tive pessoas próximas a mim que perderam. Falo pelas perdas que tive na vida de pessoas especiais. Perdi meu pai em um determinado momento e minha melhor amiga para o Covid. Vivi meu luto, porém guardo uma filosofia de que se foi bom, dói, mas não precisa ser triste. Hoje me lembro deles e sinto falta, mas eu sorrio e penso: foi bom ter vocês, obrigada!

Talvez isso não funcione para uma mãe que sonhou com seu filho em seus braços e precisou se despedir sem conhecê-lo, ou olhá-lo apenas uma vez, no entanto eu digo: tenha o seu momento. Fale todas as vezes que quiser falar. O silêncio não muda nada, só te adoece. Não falar, não chorar, sorrir, não te fará esquecer.

E lógico, a vida segue, você sabe disso. As dores seguem para um lugar guardado em nós, às vezes ela vem e as vezes ela vai. Não está tudo bem porque não somos seres preparados para morte, mas você ficará bem da sua forma, no seu tempo, vivendo as suas necessidades. Precisamos disso, desse grupo de apoio para vivenciarmos as dores, então fale, chore, diga que gostaria que fosse diferente, depois enxugue suas lágrimas e siga quando sentir vontade de seguir.

Não está tudo bem e não é fácil, mas você não está sozinha, não precisa esconder, não precisa não falar sobre e nem fingir para o resto da sua vida que é apenas uma data. É a sua vida, a sua cicatriz e a sua dor. Tudo isso fará de você quem você é e servirá para aliviar a de alguém que passou pelo mesmo.

Vamos falar sobre isso. Desmitifiquem o “está tudo bem.”

Tatiana Amaral escreve para a coluna Maternidade