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Sem Mais Delongas

Nada que eu faça vai mudar o que sinto. Vou tentar esconder dentro do meu peito endurecido de tanto apanhar, a verdade que escondo de mim, até a hora em que me deito. E sem querer me lembro do quanto fui feliz nesses natais intermináveis, nessas conversas fúteis e nas horas em que o tempo parecia congelar. Hoje sou mais inquieta com meus sentimentos, ao mesmo tempo em que sou mais acomodada com a realidade que me vence todas as vezes em que sinto algo que não está ao alcance das minhas mãos.

Vejo meu presente com um colorido vivo, bem diferente do que imaginei há anos atrás. Sinto orgulho de quem sou, de quem me tornei. Sinto saudades do que fui, mas não voltaria para a casa da minha avó. Só a visito nas noites quentes de Natal, em que consigo me lembrar com perfeição do gosto do salpicão cheio pedaços de maçãs e do cheiro doce do perfume da minha tia, aquele cheiro que lhe era peculiar em qualquer festa de família. Me lembro das pequenas discussões, das implicâncias e do nervoso que eu tinha quando o tom aumentava. Me lembro do meu primo que sempre dava tanto trabalho… até o dia em que parou de dar trabalho, subiu aos céus para dar trabalho ao povo lá de cima. Vovó deve estar cuidando dele e fazendo aquele salpicão que só ela sabia fazer.

A Tia Marly ficou serena e parou de brigar com o papai. As festas foram diminuindo e mudando de protagonistas. Hoje somos só eu, minha mulher e meu velho pai que dividimos a ceia composta com arroz, farofa, tender e uma nova receita de salpicão criada por mim. Sem maçãs, mas com o mesmo tempero, aquele com um gosto inesquecível…

Fui! (brindar a vida que eu tenho e reverenciar a que eu tive…)

Feliz Natal

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