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Barbie, a boneca multicarreira



Já que o assunto do momento é o filme da Barbie, a revista Maria Scarlet cedeu espaço no seu vermelho habitual para aderir à onda rosa. Eu não poderia ficar de fora deste momento, afinal, tem boneca que fala mais com as meninas sobre carreira que a Barbie?


Talvez hoje até tenha, mas é consenso que a Barbie foi a precursora. Foi esta boneca que trouxe a aspiração profissional para a brincadeira das meninas. Se hoje ainda estamos lutando por equidade de gênero nas oportunidades de carreira, imagina como eram as condições nos anos 60, quando a Mattel começou a apresentar a boneca em diferentes profissões!


Só para se ter uma ideia, nas minhas memórias de infância, as mães de amigos que trabalhavam fora, como costumávamos dizer, eram professoras, enfermeiras, cabelereiras ou trabalhavam no comércio. Em toda a minha infância na periferia do Rio de Janeiro, nos anos 80, não conheci uma mulher que fosse profissional em outra área.


A primeira Barbie, lançada no final dos anos 50, era uma modelo, mas apesar do estereótipo do padrão de beleza e da cultura de moda da época, ela era à frente do seu tempo: era uma boneca adulta, independente e vestindo maiô.


Nos anos seguintes, outras profissões foram inseridas, promovendo representações de mulheres em carreiras variadas. A segunda Barbie lançada era enfermeira, a terceira, comissária de bordo (conhecida como Barbie Aeromoça), a quarta, professora... De lá para cá, a Barbie já virou cientista, astronauta, atleta, até presidenta. E entre as diversas modalidades de atletas, também está lá a Barbie jogadora de futebol. Ao longo do tempo a Barbie foi se adaptando às mudanças culturais e aspirações das crianças, buscando promover mais representatividade e diversidade.



A influência da Barbie não atingiu somente as meninas cujas famílias tinham condições financeiras de comprar a boneca, não. Mesmo quem não podia ter uma Barbie, foi impactada por sua presença em diversas mídias, das propagandas a filmes, desenhos e séries na televisão, e podia imaginar uma realidade em que as mulheres eram donas da sua casa dos sonhos, do seu carro, da sua carreira... A Barbie tinha tudo isso.


Eu posso dizer que fui privilegiada, pois eu tive uma Barbie. Sim, eu tive uma, apenas uma, e não ganhei dos meus pais, pois a boneca era cara para nossa realidade. Ganhei da minha madrinha e, hoje, reconheço a sensibilidade que ela teve ao escolher uma Barbie diferente. Não havia Barbie negra na época, então ela me deu uma Barbie ruiva.


A minha boneca não tinha uma profissão (que era uma linha ainda mais cara), mas assumia diversas carreiras nas minhas brincadeiras. Nunca a imaginei como uma “filha”, como as bonecas em geral eram associadas. Ela era uma projeção do futuro profissional e assumia papéis de professora, cabelereira (o cabelo que era comprido virou “chanel” numa dessas sessões), costureira (inclusive, eu costurava roupinhas para ela com retalhos da minha mãe), enfim, a Barbie podia ser o que eu quisesse. Guardei a minha boneca como relíquia, até passar para a minha filha, mais de 30 anos mais tarde.


Mesmo quem não podia ter uma Barbie, foi impactada por sua presença em diversas mídias, das propagandas a filmes, desenhos e séries na televisão, e podia imaginar uma realidade em que as mulheres eram donas da sua casa dos sonhos, do seu carro, da sua carreira... A Barbie tinha tudo isso.

Assistir ao filme com a icônica boneca como protagonista, ao lado do meu marido e filhos já adolescentes, foi um misto de nostalgia e senso de realização. O filme é sobre empoderamento feminino, quebra de estereótipos, desconstrução do patriarcado e o sonho de uma sociedade justa e igualitária, em que mulheres (e homens) possam ser o que desejam ser, e foi gratificante constatar, mais uma vez, que meus filhos (menino e menina) têm uma visão de mundo que permite contestar os modelos tradicionais e enxergar com naturalidade a igualdade de gênero, a rir das piadas ácidas, a concordar com as mensagens subliminares e com a crítica social envolvida em tons de rosa.


Mesmo que seja considerado “lacração”, o filme Barbie traz uma inegável contribuição para o processo de avanço social ao estimular reflexões sobre as contradições de buscar ser você mesma; mas continuar sendo cobrada por um estereótipo de mulher inalcançável; sobre a falta de representatividade feminina em posições de liderança nas grandes corporações e de poder na sociedade em geral ou mesmo a importância das redes de apoio para que as mulheres possam alcançar seu pleno potencial.


Barbie e Ken, o boneco que foi lançado para ser o namorado da Barbie, evoluíram na linha de produtos da Mattel para refletir a mudança nos valores sociais e a necessidade de promover oportunidades iguais e representatividade nas narrativas infantis. Ambos os personagens passaram a ser mostrados como indivíduos independentes, cada um com suas próprias ambições e interesses profissionais, reforçando a ideia de que homens e mulheres têm capacidades igualmente valiosas. Um mundo em que o Ken era só o namorado da Barbie só servia para reforçar o quão inverossímil era. Já um cenário em que o Ken também tem sua individualidade e suas escolhas de carreira, da mesma forma que a Barbie, faz mais sentido para sedimentar o conceito e impulsionar a mudança que desejamos.


Apesar dos erros e acertos da Mattel com produtos da linha - como é natural em qualquer segmento no lançamento de produtos -, é fato que o mundo Barbie promove a diversidade e a inclusão para o imaginário infantil, com bonecas com diferentes etnias, profissões, estilos e condições, permitindo que as crianças se identifiquem e se conectem ao se verem projetadas. Nos últimos anos, a linha introduziu bonecas sem cabelo, com vitiligo, com deficiências (com prótese e usando cadeira de rodas), para proporcionar uma experiência cada vez mais representativa.


A Barbie, definitivamente, se tornou um símbolo do empoderamento para as pessoas, não somente crianças, tampouco somente meninas. Por suas histórias e pelo seu potencial para despertar a imaginação a partir de temas sobre inclusão, diversidade e equidade, a Barbie inspira as gerações mais jovens a desafiarem os padrões que são prejudiciais à sociedade que respeita e oferece oportunidades iguais a todos que estamos construindo.


Érica Saião para a coluna Mulher & Carreira

Encontre-a no instagram: @erica.saiao

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