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Matéria de capa: Thati Machado



Por: Alexia Road


Thati Machado nunca é esquecida por onde passa. Ela tem muitos títulos conhecidos: gorda. LGBTQIAPN+. feminista.


Mas, na verdade, Thati é mais que caixinhas fechadas. Nascida em Niterói nos anos 1990, a escritora e criadora do “Se liga Editorial” me chamou a atenção pela primeira vez em um evento literário. Eu, recém-publicada, estava animada para conhecer mais mulheres que escreviam e segui um dia inteiro em um evento de palestras com autoras conhecidas, que tinham algo a ensinar.


Thati foi bem simpática com todos que a escutaram, e seu discurso me impressionou. Seus livros e conteúdos em blogs e na internet eram todos diferentes. Ela escrevia sobre o que acreditava, o que defendia e o que queria que os outros começassem a entender. Ela escrevia coisas que ninguém queria ou tinha vergonha de discutir.


Pude sentir a admiração de muitos outros autores ali por sua coragem de expor suas ideias.

Seu livro Poder extra G logo parou na minha estante e, com uma leitura fluída, ele me conquistou. Recheado de representatividade, Thati trouxe o tema da gordofobia de maneira explícita e simples.


Seus personagens e seu discurso chamaram a atenção de muitos leitores, a escritora já acumula mais de 2 milhões de leituras no Wattpad.


Então, ao pensar na coluna “Gorda, sim!” na Maria Scarlet, não tive dúvidas de quem poderia dar vida a essa coluna.


Seus textos sempre vêm acompanhados de reflexões e ensinamentos importantes para a sociedade, e é um prazer trazer um pouquinho mais da colunista, escritora e editora para vocês.


MS: Thati, como começou para você esse processo de amor-próprio e respeito? E quando decidiu que era hora de compartilhar a sua experiência?


Eu sofri muito, antes de decidir respeitar e amar o meu corpo. O ódio começou aos dez anos, quando, além de ser uma menina gorda, fui abusada sexualmente. Não tive o apoio necessário, e os sentimentos de culpa e nojo me acompanharam por muitos anos. Foi no auge desse sofrimento que eu entendi ser necessário mudar minha relação com o meu corpo se quisesse ter uma vida plena e feliz. Compartilhar minhas experiências foi uma decisão que tomei apenas depois de perceber que, com terapia e autoconhecimento, era possível ressignificar essa relação.


MS: Você possui vários livros sobre diversidade lançados por grandes editoras e na Amazon. Sempre achou que as pessoas estavam prontas para ouvi-la?


De maneira nenhuma. Minha primeira publicação, inclusive, foi de um romance policial cheio de personagens dentro do padrão. Eu não acreditava que as pessoas pudessem a sentir falta da diversidade que eu sentia.


MS: A realidade da gordofobia é exposta em sua coluna “Gorda, sim!” na Revista MS. Como você começou a abordar esse assunto na sua vida e no seu trabalho?


Eu cresci devorando um livro atrás do outro, mas sem nunca conseguir me ver em nenhuma protagonista. Foi só em 2015, com Poder extra G, que decidi criar uma protagonista que se parecesse comigo. Esse foi, sem dúvidas, o ponto inicial dessa minha jornada dentro da literatura.


MS: Você é casada com um homem trans. Já sofreu algum tipo de preconceito? Como lida com isso?


Eu lido com qualquer tipo de preconceito através de luta. A minha luta, no caso, acontece através da escrita e da publicação de obras com o poder de transformar as pessoas.


MS: Considera que tivemos evoluções quanto à inclusão de pessoas gordas e LGBTQIAP+ na sociedade?


Com certeza tivemos, mas elas ainda não são o bastante. Ainda há muita confusão sobre os debates da luta antigordofobia, por exemplo. Embora o discurso de amor-próprio seja muito importante, ele não resolve nem acaba com a gordofobia. Para pessoas LGBTQIAP+, ainda é extremamente perigoso viver no Brasil, mesmo que pouco a pouco estejamos conquistando mais direitos.


MS: Muitas pessoas consideram os discursos inclusivos dispensáveis, o famoso “mimimi”. O que pensa sobre isso?


Honestamente? As pessoas que conseguem reduzir queixas e relatos, reais e válidos, a três sílabas em tom debochado nem merecem que eu gaste meu tempo com elas.


MS: Você é uma mulher muito influente nas redes sociais. Entende a importância da sua voz?


Agradeço pelo muito influente! (risos) Sinto-me honrada por ter tido a coragem e o privilégio de fazer minha voz ecoar para além de mim. Espero que outras pessoas possam vivenciar isso também. Espero estar contribuindo um pouco para isso através do meu trabalho no Se Liga.


MS: Quais soluções você enxerga para que pessoas gordas sejam mais incluídas?


Os debates antigordofobia precisam começar a fazer parte das nossas vidas. Precisamos entender a realidade das pessoas gordas e a melhor maneira de incluí-las na sociedade desde cedo. Um bom primeiro passo seria levar essa didática para as escolas, para que o debate fosse aberto desde cedo com as crianças e os jovens.


MS: O que gosta de fazer no seu tempo livre?


Tenho prezado muito pelo meu tempo livre nos últimos tempos e, por aqui, eu o chamo de “tempo de qualidade”. Sendo empreendedora e trabalhando em casa, foi difícil separar o tempo do trabalho do tempo de qualidade, mas acredito que agora encontrei um equilíbrio que tem funcionado para mim. Atualmente, uso esse tempo para assistir a filmes, séries e, em especial, doramas (estou viciada!!!). Gosto de visitar feiras, de comer fora de casa, de me reunir com os amigos para jogar jogos de tabuleiro, de passar um tempo com a minha família, de encher meu cachorrinho de abraços e beijos e de tirar um cochilo agarrada com ele no sofá!


MS: Como começou essa paixão pelos livros?


A paixão pelos livros veio de uma maneira bem inusitada. Eu era criança e não gostava de ler. Certa vez, fiz algo que não devia (juro que não me lembro do que se trata) e meu pai me colocou de castigo, que consistia em ler um livro inteiro e, ao final, responder a algumas perguntas sobre a obra para ele. O que era para ser um castigo acabou virando uma paixão. Eu devorei o livro e comecei a querer ler outros depois dele. E nunca mais parei.


MS: O que te dá disposição para continuar engajada nas causas de inclusão?


Deixar o mundo um pouco melhor (ou menos pior) para as gerações que estão vindo depois de mim. Lembro que me assumir LGBTQIAP+ foi difícil e doloroso, e eu só o fiz depois da maioridade. Hoje é possível ver adolescentes se entendendo e falando abertamente com suas famílias. Sei que isso não é uma regra e que ainda há muita LGBTfobia familiar, mas pequenas conquistas me dão esperança de um mundo melhor.


MS: Qual a mensagem que você gostaria de deixar para suas leitoras da Maria Scarlet?


Todo corpo é único e merece ser respeitado; não deixe que ninguém te diga ou ofereça o contrário. Estar confortável na própria pele requer tempo e dedicação, mas é uma experiência que vale muito a pena.







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