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Matéria de capa: Dra Fátima Duarte

A Sexóloga da Maria Scarlet


Uma poesia em forma de mulher. É assim que consigo descrever a Dra Fátima Duarte, ao pensar sobre ela. Dona de um carisma único, essa médica de olhos meigos e sorriso largo logo conquistou meu afeto e minha total confiança.

Lembro-me do dia em que cheguei em seu consultório, em São Paulo, assustada por tantos erros médicos acometidos no meu passado de bebês prematuros e hormônios prescritos sem nenhuma necessidade, e vi aquela doutora com jaleco branco cobrindo um vestido elegante com seus óculos na cor vinho com extremidades pontudas e marcadas, dando um ar de sofisticação e modernidade ao seu visual clássico.

Ela quis saber mais do que meus problemas pretéritos e buscou atender com perfeição meus desejos para voltar ao meu estado normal. Ela queria entender qual era o “meu estado normal” e, para isso, precisava entender quem eu era. Ela buscou todas as informações possíveis e, como em um quebra-cabeças, foi montando uma linha do tempo onde se conectou com cada Cris que passou por um trauma, por um desamor ou por um problema médico.

Percebi, naquela consulta, que esta mulher era especial. Entendi que carrega consigo uma determinação em cuidar da mulher que está ali, por completo. Senti-me acolhida; mais ainda, me senti em casa.

Quase um ano depois voltei ao seu consultório e, para minha surpresa, minha médica se lembrava de cada detalhe que havíamos conversado. Eu fiquei impressionada com a riqueza de detalhes com que ela me contava sobre minha própria história, infinitas partes que não constariam em um arquivo médico, por serem demasiadas diminutas ou aparentemente irrelevantes, mas que para ela eram fundamentais.

No ano seguinte voltei a morar no Rio, mas recusei despedir-me dela, afinal, ela já era uma mulher com quem eu havia trocado uma energia fundamental sobre o meu universo íntimo, aquela que me havia ajudado e entendido. Ela era aquela médica que eu queria do meu lado, onde quer que eu fosse.

Tempos depois, liguei para a minha doutora preferida e a convidei para ingressar na Revista, na modalidade de colunista. Na verdade, queria a Dra Fátima Duarte da forma como fosse possível, da forma que ela pudesse, mas queria um pouquinho deste misto de médica, sexóloga e mulher excepcional. Queria desfrutar da sua companhia e da sua poesia…

Senhoras e senhores, com vocês, Dra Fátima Duarte:

Dra Fátima, você veio para São Paulo ainda muito nova. Como foi sua infância?

Eu nasci em uma família de portugueses, meus pais vieram para o Brasil com 02 irmãos, em busca de uma melhor qualidade de vida e aqui fui a primeira dos 04 filhos brasileiros. Por serem imigrantes e com opções limitadas, acabamos nos mudando diversas vezes de casa, de bairro e até de cidade.

Todos nós estudávamos em colégios públicos e éramos os melhores alunos da sala e, inclusive do colégio. O estudo virou nosso passatempo predileto e, com o tempo nossos professores perceberam nosso empenho e sempre nos estimulavam a melhorar cada vez mais, nos recompensando com diversas medalhas acadêmicas.

Eu sempre fui muito ligada aos meus irmãos e, ate hoje sinto muito a perda de um deles, em um trágico acidente, ainda na infância…

Você tem uma relação intensa com o universo da literatura e da poesia. De onde vem essa paixão?

Eu aprendi a ler com cinco anos e desde que me entendo por gente já declamava poemas. A língua portuguesa sempre foi uma das minhas matérias favoritas e me acompanha até hoje, através de leitura e da poesia.

Você sempre soube que seria médica?

Engraçado pensar que tudo na minha vida iniciou quando eu tinha 5 anos…. com essa idade sofri um acidente que machucou minha boca gravemente e fui levada às pressas para o hospital para uma cirurgia de emergência. Lembro-me que fiquei maravilhada com o trabalho do médico, que não me deixou nenhuma cicatriz. Nesse momento entendi que queria ser médica.

Quando entrei na faculdade fui seduzida pelo universo do corpo feminino e optei por seguir ginecologia e obstetrícia. Anos depois me especializei em sexualidade pela USP, onde consegui encontrar a tríade do meu melhor desempenho profissional.

Você desenvolve um trabalho brilhante à frente do Programa “Sábado Sem Barreiras”. Pode falar um pouco sobre ele?

Desenvolvo este trabalho em um espaço de atendimento multidisciplinar realizado no Serviço Público do Hospital Pérola Bayngton, em São Paulo, onde atendo mulheres deficientes . Entendi, ao longo da minha caminhada que precisava ajudar mulheres que haviam sido negligenciadas em sua sexualidade por conta da questão física e resolvi acolh-las de uma forma positiva, entregando meu conhecimeno técnico como médica e sexológa.

Em 11 anos de trabalho foram atendidas muitas mulheres e destas com deficiência, sendo 49% das pacientes com deficiencia mental, 39% com deficiencia fisica, 6% com deficiencia mista e 2% com deficiencia auditiva.

Um dos dados mais curiosos (e triste) deste trabalho foi a resposta que obtive quando perguntei sobre suas vidas sexuais: das 181 mulheres entrevistadas, apenas 51 disseram ter atividade sexual e mencionaram que jamais haviam sido questionadas sobre a qualidade de sua vida sexual.

Você se sente realizada como médica? O que ainda falta para você no âmbito profissional?

Gostaria de que as mulheres pudessem optar livremente pelos métodos anticoncepcionais, pelo direito de serem mães, de decidirem sobre seu próprio corpo e que possam ter o direito ao estudo e trabalho.

Primeiro não existe independência afetiva sem independência econômica, as mulheres tem que ter trabalho, autonomia para que possam dirigir seus sonhos compatíveis com seus projetos de vida.

Que a saúde possa ser para todas, que as mulheres não morram de morte evitável como parto, câncer de colo de útero, violência sexual, que não se percam no labirinto da mamografia, das cirurgias adiadas.

Que mensagem você gostaria de deixar para suas pacientes e seguidoras da Maria Scarlet?

Informe-se. A mulher informada faz escolhas melhores. Converse com outras mulheres. Divida suas alegrias e suas dores. Lute pelos seus direitos.

Seja livre, sonhe, ouse.

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